Datura stramonium – Classificação e identificação

  • Família: Solanaceae (onde existem cerca de 3.000 espécies)
  • Ordem: Solanales
  • Sub-classe: Lamiidae
  • Classe: Magnoliopsida
  • Sub-divisão: Magnoliophytina (Angiospermae)
  • Divisão: Spermatophyta
  • Tipo Fisionómico: Terófito

Também conhecida como:

Trombeta, trombeteira, estramónio, erva dos bruxos, figueira-do-demo, figueira-do-diabo, figueira-do-inferno, figueira-brava ou zazumba.

Em inglês é conhecida por Jamestown weed ou Jimsonweed, na sequência de um episódio de intoxicação das tropas inglesas na guerra da independência dos Estados Unidos, após ingestão em massa desta planta pelos soldados, no ano de 1676 em Jamestown, Virgínia.

Na história existem várias referências relacionadas com ingestão e uso desta planta. Desde o Odisseia de Homero, bem como a sua utilização em numerosos rituais místicos e religiosos por povos da Europa, Ásia e Novo Mundo. Os efeitos alucinogénicos que provoca, faziam crer na comunicação com deuses e entidades divinas.

Existem inúmeros relatos da sua utilização por curandeiros e feiticeiros, com intuitos medicinais ou criminosos.

A planta nas nossas latitudes tem um período de floração entre Junho e Outubro, e é uma contaminante dos terrenos cultivados. Encontra-se frequentemente nas plantações de cereais e soja.

Figura 1. Campo de milho contaminado.

A Datura stramonium apresenta uma forte toxicidade para animais e pessoas, e todas as partes da planta, desde a raíz às sementes são tóxicas. Os animais em pastagem raramente a ingerem pelo seu cheiro e paladar desagradáveis. Logo, o consumo espontâneo só será feito em condições de forte escassez alimentar.

No entanto pode por descuido ser incluída nas silagens para alimentação de ruminantes, e as suas sementes facilmente contaminam os grãos de cerais ou soja.

Figura 2. Aspecto geral da planta.

Figura 3. Aspectos das flores, frutos e sementes.

A planta contém doses elevadas de alcalóides tropânicos, nomeadamente a Hiosciamina e a Escopolamina.

São produtos anti-colinérgicos que bloqueiam a acetilcolina e são usados como fármacos anti-espasmódicos.

Figura 4. a) Estrutura química da L-Hiosciamina; b) Estrutura química da L-Escopolamina.

Em termos muito gerais, bloqueiam a acção da acetilcolina ao nível dos receptores muscarínicos. Produzem por isso alterações no funcionamento das terminações do sistema nervoso parassimpático, do músculo liso, glândulas e sistema nervoso central. Aumentam o rendimento cardíaco, diminuem a secreção das glândulas e antagonizam a acção da serotonina.

No Homem os efeitos secundários mais comuns são:

  • Secura de boca
  • Perturbações de visão
  • Agitação
  • Enjoos
  • Arritmias
  • Dispneia
  • Desmaio

Igualmente na espécie humana, por sobre dosagem provocam:

  • Dor de cabeça
  • Vómitos
  • Diarreia
  • Desorientação
  • Alucinações e euforia
  • Alterações nas manifestações afectivas
  • Perda de memória
  • Coma

A Datura stramonium faz parte da lista das substâncias indesejáveis, conforme anexo da Directiva 2002/32/EC.

Estabelece um teor máximo de 1 000mg/kg para todos os alimentos.

Figura 5. Distribuição em Portugal.

Distribuição em Portugal

Efeitos da Datura stramonium em aves

A figura 6 representa o principal perigo da Datura em relação às aves.

Figura 6. Grãos de milho contaminados com sementes de Datura stramonium.

Se existirem plantas em número significativo em terrenos de cultivo de cereais ou de soja, uma contaminação importante pode ocorrer. Uma única planta de Datura pode produzir até 30 000 sementes. Essas sementes são extremamente resistentes e podem ser viáveis por períodos superiores a 40 anos. O risco pode vir através de um campo contaminado, ou por acumulação de sementes no fundo dos silos de armazenamento (em secadores de milho, por exemplo) em casos em que os preceitos básicos de higiene e de boas práticas não são cumpridos com rigor.

De acordo com Werner e Brehmer (1967), as aves possuem uma enzima (hidroxilase) que inactiva os alcalóides tropânicos, tornando-as menos expostas aos efeitos da toxicidade, em comparação com outros animais de interesse pecuário.

Vários estudos consultados referentes a um período temporal alargado, apontam resultados contraditórios no que diz respeito à toxicidade da Datura estramonium em aves. No geral são referidos poucos efeitos adversos por ingestão das sementes. Como seria de esperar, esses efeitos dependem da dose e tempo de exposição ao tóxico.

Referem a recusa de alimento, diarreia e quebra das performances produtivas. A bibliografia refere contaminações que vão de 1 a 9 000 sementes/kg de alimento ingerido.

No entanto, a administração de extratos de sementes a ovos embrionados, provoca efeitos tóxicos expressivos, com morte dos embriões.

Observações pessoais em casos confirmados de contaminação (caso da figura 6 – foto pessoal) demonstram em frangos e perus:

  • Forte diminuição do consumo de alimento;
  • Diarreia profusa;
  • Sintomatologia nervosa – apatia ou hiperexcitabilidade;
  • Morte súbita sem lesões significativas na necrópsia.

As situações de campo de intoxicação por Datura estramonium têm geralmente um diagnóstico difícil.

Há uma falta de sensibilização e de informação dos técnicos para o problema. Por outro lado, a sintomatologia presente é comum a outras patologias, tidas como mais frequentes. Na prática pode existir uma intermitência dos lotes de alimento contaminados, por maior concentração de sementes em alguns desses lotes ou partes de lote – efeitos do diferente peso específico das sementes de Datura, face aos outros componentes da ração. Na prática pode existir o problema num pavilhão, enquanto que no pavilhão vizinho da mesma exploração tudo corre bem, ainda que tenha sido o mesmo carro a fornecer o alimento.

Estamos perante um problema que nos oferece mais interrogações do que respostas.

A patologia avícola raramente segue um padrão linear, uma simples relação causa – efeito.

Pergunto:

Qual o real efeito, a responsabilidade de uma ração contaminada por Datura estramonium em conjunto com um ou vários problemas frequentemente diagnosticados em avicultura. Por outras palavras:

Datura + disbacteriose + mau maneio + infecções virais ou bacterianas + outras causas alimentares + problemas a montante nos reprodutores + incubação deficiente + … etc…???

Deixo a pergunta no ar…

José João Rainho de Sousa Nunes

Médico Veterinário

TNA – Tecnologia e Nutrição Animal, S.A.

Nota: Resumo de comunicação apresentada nas III Jornadas de Alimentação animal da IACA

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